Do direito sucessório dos cõnjuges no novo Código Civil Brasileiro: Análise em paralelo com a sucessão hereditária do convivente ou companheiro sobrevivente

AutorMaria Isabel Jesus Costa Canellas
CargoAdvogada civilista e Professora de Direito Civil nos cursos de Graduação e Pós-Graduação lato sensu da Instituição Toledo de Ensino - Bauru - SP
Páginas3-25

Derecho sucesorio de los cónyuges en el nuevo Código Civil Brasileñero Análisis en paralelo con la sucesión hereditaria del compañero

Hereditary Succession Of The Marital Surviving Spouse In The Brazilian New Civil Law: An attempt to analyze the married surviving spouse inheritable succession in comparison with the post mortem state of a non- matrimonial union of a couple partnership of opposite sex who has lived in a family likeness relationship as husband and wife. Page 3

Advogada civilista e Professora de Direito Civil nos cursos de Graduação e Pós-Graduação lato sensu da Instituição Toledo de Ensino - Bauru - SP. Mestre em Direito pela ITE-Bauru e em Letras pela USC-Bauru. Supervisora Editorial da RIPE. Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos. DivisãoJurídica/ ITE. Presidente do Núcleo Regional do IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família (Bauru-SP). Pesquisadora-membro do Núcleo de Pesquisa Docente da Faculdade de Direito de Bauru - ITE. Membro da equipe dirigente do NIC e professora orientadora do NIPEC: Núcleos de Iniciação à Pesquisa Científica da Instituição Toledo de Ensino.

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1. Da posição do cônjuge na sucessão legítima

Profundas e de grande relevância são as alterações realizadas pelo novo Código Civil, no que se refere à pessoa, à família e, especialmente, ao direito sucessório dos cônjuges. Conforme entendimento doutrinário já em construção, o novo Diploma valorizou o casamento como um negócio jurídico especial de Direito de Família, diferenciado da união estável, privilegiando a posição do cônjuge na sucessão legítima e passando a considerá-lo, inclusive, herdeiro necessário, com os ascendentes e descendentes (art. 1.845).

De fato, o que está a causar muita discussão como uma das mudanças mais ousadas do novo Estatuto civilista, é a que diz respeito ao novo direito sucessório dos cônjuges e à frontal desigualdade, nesse aspecto, quanto ao novo direito sucessório dos companheiros na união estável.

Além disso, ao alterar a ordem da vocação hereditária na sucessão legítima, o novo Código (art. 1845 c/c art. 1829) converte o cônjuge sobrevivente em herdeiro necessário, repetindo a regra do art. 1.721, do Código Civil de 1916, segundo a qual pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima, ressalvados os casos de indignidade e deserdação.

Dispõe o novo Código Civil:

Art. 1.845. São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.

Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.

Nesse sentido, ensina Zeno Veloso:

"Porém, o novo Código Civil não erigiu o cônjuge à condição de herdeiro necessário, apenas, mas a de herdeiro necessário privilegiado, pois concorre com os Page 4 descendentes e com os ascendentes do de cujus. Esta posição sucessória reconhecida ao cônjuge sobrevivente é um dos grandes avanços do novo Código Civil."1

Não obstante, se o autor da herança não deixou descendentes ou ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge sobrevivente, como herdeiro da terceira classe, independentemente do regime de bens do casamento (arts. 1.838 e 1.839 c/c 1.850), conforme será demonstrado no presente trabalho.

Desse modo, na sucessão legítima, morrendo o marido ou a mulher sem deixar testamento válido de conteúdo patrimonial e, sendo, pois, legítima a sua sucessão, isto é, sucessão legal, de acordo com o determinado em lei, quais são os direitos do cônjuge sobrevivente, do viúvo ou da viúva no novo Código Civil, que entrará em vigor em janeiro de 2003?

Para facilitar o entendimento do alcance das mudanças, o Professor Euclides de Oliveira assim se manifesta, dando um exemplo concreto dessa posição: correspondente à parte indisponível do patrimônio, também chamado legítima, de tal modo que o cônjuge sobrevivente passa a ficar em igualdade com os filhos e pais do falecido.

"Os personagens são um homem com três filhos do primeiro casamento, que se casou pela segunda vez no regime da comunhão parcial, ou passou a viver em união estável. De acordo com a legislação vigente, se ele morrer, a atual esposa ou companheira será apenas meeira dos bens adquiridos durante o casamento ou a união, não tendo direito à herança. Com o novo código, os outros bens do falecido serão partilhados entre ela e os três filhos. Como também passará a ser herdeira necessária, ela não poderá ser excluída, por testamento, da partilha de metade dos bens do marido."2

A finalidade protetiva da norma é assegurada pelo próprio jurista Miguel Reale, coordenador da comissão encarregada de preparar o projeto do novo Código Civil, em entrevista exclusiva a Mauro Mello, no Jornal Tribuna do Direito: Page 5

"Em primeiro lugar, ela se deve à equiparação dos cônjuges e, em segundo, é conseqùência da mudança do regime de bens. Porquanto, no regime anterior, o que prevalecia era o regime da comunhão universal, de tal maneira que cada cônjuge era meeiro, não havendo razão nenhuma para ser herdeiro. Tendo já metade do patrimônio, ficava excluída a idéia de herança. Mas no momento em que nós passados do regime da comunhão universal para o regime parcial em comunhão de aqùestos, a situação mudou completamente. Seria injusto que somente o cônjuge participasse daquilo que é produto comum do trabalho, quando outros bens podem vir a integrar o patrimônio a ser objeto da divisão. Nesse caso, o cônjuge concorre com os descendentes e com os ascendentes até um quarto. Quer dizer, ele nunca será privado de menos de um quarto daquilo que é objeto de partilha e não resulta do trabalho comum, que já é o resultado do aqùesto. De maneira que são duas razões: de um lado, uma razão de ordem técnica social, que é a mudança de regime de bens do casamento; e a outra, este novo sentido da equiparação do homem e da mulher, pois a grande beneficiada com este dispositivo, no fundo, é mais a mulher do que o homem."3

Efetivamente, de acordo com a nova redação do Estatuto civilista, a ordem da vocação hereditária está assim estabelecida:

ART. 1829 - A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I- aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II- aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III- ao cônjuge sobrevivente; Page 6

IV- aos colaterais.

Convém aqui fazer a seguinte observação: somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente (art. 1830). Ressalte-se, todavia, que a concorrência do cônjuge sobrevivente com os descendentes vai depender do regime de bens do casamento.

Oportuno salientar que não se deve confundir meação com direito hereditário. A meação decorre de uma relação patrimonial (comunhão), prevista no Direito de Família, já existente em vida dos cônjuges; é o regime de bens que vigorará entre eles durante o casamento e que é estabelecido por lei ou pela vontade das partes. Depende, pois, do regime de bens do casamento. A sucessão hereditária é transmitida aos sucessores conforme as previsões legais (sucessão legítima) ou a vontade do hereditando (sucessão testamentária).

Na lição de Zeno Veloso:

"Alguém pode ser meeiro e herdeiro, como pode ser meeiro sem ser herdeiro, ou herdeiro sem ser meeiro. Essas posições jurídicas têm causa diversa, são diferentes, e se baseiam em motivos e regras distintas. Se os bens são comuns, o [companheiro] cônjuge" sobrevivente tem direito à meação. Mas este direito não tem origem na morte do outro convivente. O meeiro já é dono de sua parte ideal antes da abertura da sucessão, por outro título. Trata-se de situação que decorre do Direito de Família, não do Direito das Sucessões. A meação do falecido é que vai ser objeto da sucessão juntamente com os outros bens, de propriedade exclusiva, se houver."4 (Destacou se)

Na seqùência, apresentamos as hipóteses de concorrência ou não do cônjuge na herança do cônjuge falecido, por meio de esquemas.

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2. Da concorrência do cõnjuge sobrevivente na sucessão do falecido
2. 1 Hipóteses em que não há concorrência do cônjuge sobrevivente com os descendentes, na herança do falecido
  1. HIPÓTESE: Marido e Mulher casados no o regime da Comunhão Universal de Bens (patrimônio comum).

    O cônjuge sobrevivente somente terá direito à meação (art. 1829, inciso I), não havendo concorrência na herança do falecido.

    (Fig a Pdf)

    1. Passo: 50% da totalidade dos bens pertence ao cônjuge sobrevivente = meação.

    2. Passo: 50% patrimônio = herança = dividida igualmente entre todos os filhos.

    F1= 1/3

    F2= 1/3

    F3= 1/3

    Obs: A "totalidade" dos bens compreende aqueles trazidos para o casamento assim como os adquiridos na constância deste.

  2. HIPÓTESE: Marido e Mulher casados no regime da Separação Obrigatória de Bens.

    1. O cônjuge sobrevivente não terá direito à meação* e nem concorrerá à herança com...

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