La función jurisdiccional y la protección del medio ambiente: notas sobre el principio del contaminador-pagador

AutorFrancisco José Rodrigues De Oliveira Neto
CargoDoutor em direito pela universidade Federal de Santa Catarina
Páginas351-365

Page 352

1. Introdução

O objetivo do presente trabalho é analisar as alterações promovidas na an-tiga estrutura do Estado de Direito, que agora se apresenta como Estado Demo-crático de Direito, e seus relexos no direito ambiental. A preocupação central desse novo momento é a concretização das normas constitucionais, de modo que, para isso, necessária a existência de mecanismos de concretização, ou seja, de um aparato teórico que viabilize esta pretensão. E foi justamente o que ocorreu no campo especíico do direito ambiental, já que novos princípios surgiram, todos eles sem perder de vista a efetiva concretização dos comandos constitucionais.

Por esse motivo é que, na primeira parte do texto, dá-se uma atenção espe-cial para a função jurisdicional e sua alteração em face da nova coniguração do Estado. Fato consolidado e consumado no Direito brasileiro, é sua adesão ao Estado Democrático de Direito com todas as suas consequências, inclusive em

Page 353

relação à função jurisdicional onde o juiz, de mediador de conlitos, passa a ser instrumento de garantia de direitos fundamentais.

Na segunda e derradeira parte, a abordagem é dirigida especiicamente ao direito ambiental e um dos seus princípios que melhor demonstra a preocupação com a efetivação dessa modalidade de direito fundamental. Trata-se do princípio do poluidor-pagador, o qual trás em seu cerne o rompimento das amarras impostas pelo liberalismo e a nítida e clara adesão aos postulados do Estado Democrático de Direito e a nova compreensão da jurisdição que este aparato teórico proclama, de onde exsurge o alto poder de intervenção da jurisdição atual.

2. A função jurisdicional: do estado de direito ao estado constitucional de direito
2. 1 A função jurisdicional no Estado de Direito

Classicamente entendida como uma das funções do Estado e, ao lado da função executiva e da legislativa, manifestação da soberania estatal, a função jurisdicional passou por transformações signiicativas no Estado Moderno.

Em um primeiro momento, quando do surgimento do Estado de Direito na sua versão de Estado de Direito Liberal1, o que dela se esperava era apenas e tão somente a repetição do que dizia a lei, ou seja, o juiz era então a boca que pronunciava as palavras da lei, exatamente como sustentavam os adeptos da teoria da separação de poderes e que nela viam a forma de fugir do absolutismo antes existente.

Tratava-se de uma fórmula em que o direito era identiicado com a lei, coniando aos Tribunais “a missão de estabelecer os fatos dos quais decorrerão as consequências jurídicas, em conformidade com o sistema de direito em vigor. A doutrina da separação dos poderes é ligada à uma psicologia das faculdades, em que vontade e razão constituem faculdades separadas. Com efeito, a separação dos poderes signiica que há um poder, o poder legislativo, que por sua vontade ixa o direito que deve reger certa sociedade; o direito é a expressão da vontade

Page 354

do povo, tal como ela se manifesta nas decisões do poder legislativo. Por outro lado, o poder judiciário diz o direito, mas não o elabora.”2Autores como Chiovenda, estudiosos do direito processual e que almejavam estabelecer os parâmetros da atuação jurisdicional, como bem recorda Marinoni3, airmavam que a jurisdição era voltada exclusivamente para a atuação da vontade concreta da lei, já que consistia “na substituição deinitiva e obrigatória da ativi-dade intelectual não só das partes, mas de todos os cidadãos, pela atividade inte-lectual do juiz, ao airmar existente ou não existente uma vontade concreta da lei em relação às partes”.

Nada mais evidente e representativo de que a compreensão era no sentido do verdadeiro poder estatal estar na lei, ao passo que a jurisdição somente se manifestava a partir da revelação da vontade do legislador, inexistindo qualquer papel de criação na atividade do juiz.

Contudo, a verdade é que, ainda que tal concepção se mostrasse como um avanço em relação a fase anterior, em que os juízes eram ligados e dependentes do poder absoluto e por isso mesmo também mecanismo de opressão, o que se percebeu é que esta fórmula ainda deixou espaço para o inadequado uso do poder político. Um primeiro sinal de esgotamento já havia sido sentido no inal do Sé-culo XIX. Naquela época, após um momento de liberalismo levado ao extremo, chegou-se a um quadro social dos mais desagradáveis em relação aos níveis de miséria e fome, indicando claramente o esgotamento desse modelo como postura política, econômica e social e consolidando a concepção de que “Eram três as possibilidades abertas aos pobres que se encontravam à margem da sociedade burguesa e não mais efetivamente protegidos nas regiões ainda inacessíveis da sociedade tradicional. Eles podiam lutar para se tornarem burgueses, poderiam permitir que fossem oprimidos ou então poderiam se rebelar.”4Com o objetivo de superar as diiculdades apresentadas pelo Estado Liberal, a rebeldia foi o caminho de muitos, o que fez surgir o Estado de Direito Social, formulação que intentou adaptar as bases do Estado Liberal para nele incluir os direitos sociais revisando os dois pontos principais sobre os quais se assentava o liberalismo: o individualismo e o abstencionismo do Estado. Tinha ainda como objetivo demonstrar a incapacidade do modelo liberal clássico para resolver os difíceis e complexos problemas de uma sociedade industrializada e com novas características como, por exemplo, a cultura de massas, a sociedade de consumo, o progresso da técnica, etc. Eram problemas que não pareciam encontrar suicien-te solução com a adoção dos instrumentos e procedimentos típicos do liberalismo.5

Page 355

Compondo seu ideário, impôs-se a visão de que um Estado deveria ser intervencionista e ativo, com um poder executivo forte, bem administrado tecnicamente, tudo com o objetivo de bem controlar a atividade econômica e social e construir um estado de bem estar social (welfare state). De todas as suas caracte-rísticas, a principal era o irme propósito de compatibilizar em um mesmo sistema dois elementos: 1) o capitalismo como forma de produção e 2) a concretização de um bem-estar geral. A crença de que isso era possível constituía “el elemento psicológico, y al mismo tiempo ideológico, que sirve de base al neocapitalismo típico del Welfare State”.6Com isso, novas funções viriam a ser reservadas aos Estados, deixando eles de apenas declarar direitos e separar poderes como na visão meramente liberal. Passariam a incorporar e declarar direitos sociais, prestações impostas ao Estado, que deveriam ser realizadas em favor dos mais desfavorecidos, o que representa, sem dúvida alguma, uma grande transformação na estrutura do antigo Estado Liberal, sem se transformar em Estado Proletário como nos países do chamado “socialismo real”.7Contudo, com o passar dos anos, o que se apresentava como algo capaz de solucionar os problemas gerados pela crescente complexidade das relações sociais, políticas e principalmente econômicas mostrou-se insuiciente e permitiu o surgimento de reações diversas daqueles pretendidas no início das transformações políticas.

A primeira delas foi a reação marxista. Como acima colocado, o Estado Social é uma teoria crítica ao Estado Liberal burguês e a todos os seus fundamen-tos, o que é feito através da demonstração das contradições internas do liberalis-mo e da vacuidade de suas promessas. Usando esse discurso, os marxistas sustentam que o Estado é um instrumento de dominação e que a verdadeira transformação só se dará por meio de um processo revolucionário e de uma ditadura do proletariado.8 Foi exatamente isso que se tentou implantar com a Revolução Russa de 1917, à qual historiadores como Eric Hobsbawm dão igual impor-tância à conferida à Revolução Francesa no século XVIII.9Uma segunda reação ocorreu com os chamados “Estados Totalitários” implantados no período compreendido entre as duas Guerras Mundiais do século
XX. Apesar de ser um fato histórico e político de menor importância e de curta duração, merece atenção por partir de uma concepção substantiva de poder que o localiza não em uma classe social, como é o caso do liberalismo ou do marxismo.

Page 356

Coloca o poder em uma elite, o que justiica pela ideia de superioridade de um indivíduo sobre a massa, além da valorização de princípios como personalidade, autoridade, ortodoxia e exclusividade.10Se, de início, o que se pretendia era a superação do Estado Liberal, logo se percebeu — especialmente em função de sua fraqueza teórica — que não se tratava de superação alguma, mas apenas e tão somente de um “enmascaramiento de los peores defectos e inconvenientes de éste, agravados además como consecuencia de su organización totalitaria del poder”.11Além disso, o exame das suas principais características demonstra que não se tratava de uma nova teoria ou concepção de Estado, mas de uma remodelação das bases do Estado Liberal com as seguintes adaptações:12 1) inseriu-se uma ideologia oicial com caráter de dogma, implantada à força; 2) fomentou-se a apatia política, o que ocorreu em consequência da inferioridade das massas em relação ao “poder intelectual” das elites; 3) os direitos e liberdades decorriam apenas e tão somente do Estado, submetidos a suas conveniências e interpretações;
4) consolidou-se a igura de líder político como detentor do poder constituinte; 5) estabeleceu-se uma organização, partido político ou não, funcionando como corrente de transmissão entre governante e governado; 6) criou-se um aparato policial a serviço da...

Para continuar leyendo

Solicita tu prueba

VLEX utiliza cookies de inicio de sesión para aportarte una mejor experiencia de navegación. Si haces click en 'Aceptar' o continúas navegando por esta web consideramos que aceptas nuestra política de cookies. ACEPTAR