A incompatibilidade do princípio da eficiência e o modelo de monopólio postal

AutorAdeneele Garcia Carneiro/Antonio Celso Baeta Minhoto
CargoDiscente do Programa de Mestrado da (unimar)/Doutor em direito Público pela instituição toledo de ensino de bauru, SP
Páginas264-281

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I Introdução

O processo de comunicação se faz presente desde os primórdios da huma-nidade em diferentes tipos de manifestações, fazendo a conexão do homem com o meio em que ele está inserido, socializando o indivíduo.

Dentre as inúmeras formas de comunicação a escrita tem seu elevado grau de importância reconhecido, uma vez que é referencialmente um marco na evo-lução do desenvolvimento intelectual do ser humano, e seu advento possibilitou o trânsito de ideias, informações, descobertas, invenções, dentre outros tipos de dados, para além da presença física do autor, transpondo as barreiras fronteiriças da disseminação do conhecimento.

Nesse contexto o responsável por transportar tal escrita não poderia deixar de ter sua relevância para o meio social, estando assim a prestação do serviço postal elevado a patamar de serviço indispensável a sociedade e não compreen-dido como mera atividade comercial.

Como toda atividade essencial, é de extrema necessidade haver regulamen-tação jurídica, sendo assim, por se tratar de serviço basilar de suma importância, há expressa previsão em nossa legislação maior a Carta magna de 1988, que por ter sido promulgada a mais de 20 anos tem atualmente sua posição sobre o tema posta em xeque, acarretando diferentes interpretações no que tange o modelo do setor postal vigente.

Atualmente a prestação dos serviços postais se dá por meio da Empresa de Correios e Telégrafos-ECT, e desempenha a função de entrega de mais de oito bilhões de itens por ano e possui cerca de 58.936 carteiros, um monopólio legal controlado exclusivamente pelo Estado, com caráter de empresa pública.

Destarte, a discussão que se pretende aduzir cerne quanto a eiciência dessas atividades enquanto prestadas com o caráter de monopólio legal, tomando como parâmetro o princípio constitucional que rege as atividades da administração pú-blica, disposto no artigo 37 da Constituição Federal de 1988, na busca de garantir um serviço de qualidade, que gere bons resultados, e busque a prevalência do

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interesse da sociedade como um todo sobre o de particulares, velando pelos direitos dos usuários do serviço.

Uma vez que, os ditames do mercado advindos das transformações decorrentes das inovações tecnológicas, das operações internacionais, da maior exigên-cia dos consumidores, têm obrigado todos os setores da economia, inclusive os serviços postais, a necessidade de se atuar com eiciência, trazendo subsídio para fomentar a relexão sobre os atuais fundamentos regulatórios que norteiam a ati-vidade e sua compatibilização com tais mudanças, com o objetivo de primar pelo bem-estar social.

II Material e métodos

O estudo desenvolver-se-á por meio do uso de material bibliográico. A apresentação do desenvolvimento do objeto da presente pesquisa dar-se-á median-te a adoção do procedimento dedutivo, auxiliado pelos procedimentos histórico e comparativo. A averiguação a ser levada a efeito neste trabalho utilizará como expressão instrumental a análise e ichamento de material bibliográico e exame de legislação.

3. Breve relato histórico do serviço postal

A abordagem histórica aqui suscitada serve como orientação da evolução de forma conjunta com a legislação sobre o serviço postal, que no Brasil surgiu junto com o país, quando Pedro Vaz de Caminha em 1500, anunciou ao rei de Portugal o descobrimento da nova terra, desde então, muitas transformações ocorreram, mas apenas em 25 de janeiro de 1663 é que icou reconhecido a instituição dos Correios.

Até meados de 1700 essa instituição tinham sentido exclusivamente admi-nistrativo, utilizado apenas pelo governo, com inalidade de suprir as necessidades governamentais de comunicação dos homens de negócio, ou seja eram linhas postais isoladas sob a proteção dos governadores de algumas capitanias.

Em 1798, os serviços passam a ser administrados pela coroa e se inicia a regulação do serviço postal interno, com a criação da primeira agência postal oicial do interior, na cidade de Campos, no Rio de Janeiro, o que desencadeou no decorrer do tempo as caixas postais e a instituição do serviço para outras cidades, trazendo à tona o sentido de serviço comercial e econômico.

Já no período imperial houve por meio de D. Pedro I a reorganização dos Correios do Brasil e mais tarde o desencadeamento das reformas postais que geraram o estabelecimento do serviço telegráico por D. Pedro II, fazendo com que o país aderisse à tratados de organismos internacionais de telecomunicações até então existentes, consolidando uma espécie de monopólio natural por volta de 1800, por força da natureza econômica de serviço público que desempenhava naquele contexto.

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Por não possuir interessados particulares na exploração das atividades pos-tais, a natureza de monopólio natural, no período imperial era justiicável, uma vez que, para assegurar a prestação dos serviços, o Estado deveria atuar exclusivamente para garantir a devida continuidade, conforme suscita GABAN.1Com o advento do Decreto de 5 de março de 1829 pelo imperador, para conferir uma uniicação de todas as linhas postais até então existentes numa administração geral e tratar das questões administrativas dos Correios, houve a pre-ocupação de legislar sobre a regulação da atividade dos correios e telégrafos federais o que ocorreu em 1891, consolidando o primeiro indício constitucional sobre o tema, que se deu por meio da carta política em seu artigo 34, XV, que assegurou a competência privativa do Congresso Nacional para tanto.

Somente em 1931 foi Criado o Departamento de Correios e Telégrafos, que na Constituição de 1934 expandiu a competência exclusiva da união para manter os serviços postais, tendo o mesmo entendimento consolidado na constituição de 1937 em seu artigo 15, VI.

Mais adiante na Constituição de 1946 já não se falava em exclusividade da União, a previsão sobre o tema no artigo 5, XI, descaracterizava a previsão dire-ta de monopólio, demonstrando a inconstitucionalidade do modelo implantado. Ocorre que a mesma Constituição abriu brechas na redação de seu artigo 146, que versava sobre a possibilidade de que mediante lei especial a União poderia inter-vir no domínio econômico e na monopolização, abrindo um leque para que fosse monopolizadas inclusive outras atividades além das postais.

Além da descaracterização da natureza jurídica de monopólio dos serviços postais na ordem constitucional, que se manteve até a constituição de 1988, resta mais indícios que confrontam a consistência na argumentação de exclusividade legal da atividade postal.

Com a reorganização do serviço postal a partir de um modelo mais moderno que o do DCT, esse novo cenário se mostrou cada vez mais empresarial, foi então que surgiu em 20 de março de 1969 a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos ECT ratiicado pela Lei n° 6.538, de 22 de junho de 1978.

O que nos leva a reletir sobre a evolução dos serviços postais na ordem jurídica como tendo sua importância na seara político-econômica, retratada na medida em que conforme aumentava-se as razões para descaracterização de mo-nopólio natural, mais eram demonstradas a necessidade de assegurar o monopólio, não longe da atual conjuntura, que trazida pela ótica da eiciência não merece ser considerada, já que a livre concorrência se experimentada poderia ser base para a reestruturação da regulação postal.

4. O atual modelo postal no Brasil

Conforme suscitado no contexto histórico o serviço postal, teve seu modelo deinido pelo Decreto-lei n°. 509/69 que posteriormente foi ratiicado pela Lei n°

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6.538, de 22 de junho de 1978. Tal norma deine as áreas de serviços reservados a atuação exclusiva da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos — ECT, uma empresa pública com reserva de exclusividade na prestação dos serviços postais, sob o prisma de disseminador e garantidor universal desses serviços, sustentando uma das bases de infraestrutura básica de comunicação do Brasil.

O modelo de estruturação do monopólio postal, modelo existente a muito que baseia nas seguintes previsões constitucionais: no título II — Dos Direitos e Garantias Fundamentais em seu artigo 5º, inciso XII que prevê a inviolabilidade do sigilo da correspondência e as possíveis exceções e no título III — Da Organização do Estado, o artigo 21 inciso X da CF que dispõe sobre a competência da União para manter o serviço postal e o correio aéreo nacional”.

O último preceito constitucional suscitado baseia um dos fundamentos de justiicação da intervenção direta do estado na regulação do setor postal bem como o monopólio estatal, e acalora as discussões sobre o verdadeiro signiicado do verbo “manter” disposto na cláusula pétrea em questão, nesse sentido conforme citado por Gesner Oliveira no prefácio da obra de Gaban sobre o voto do Minis-tro Marco Aurélio em posicionamento na ADPF 46-7/DF, STF menciona:

Nesse contexto, qual o signiicado do teor do inciso X do art. 21? Será que o sen-tido da expressão “manter o serviço postal” é hoje o mesmo de duzentos anos atrás, quando, pelo Alvará de 20 de Janeiro de 1798, instituiu-se que competia aos poderes públicos o processo de organização postal dos Correios Terrestres? Será que se está condenado a icar permanentemente atrelado ao passado, ignorando que o sen-tido das normas também é condicionado pela evolução da vida, da vida em sociedade?2A expressão, para o Ministro, não teria interpretação de serviço obrigatoria-mente prestado diretamente pelo Estado, teria portanto o signiicado da atuação da União como garantidora da prestação do serviço postal, icando a cargo a mínima intervenção direta eventualmente.

Há controvérsias sobre o tema uma vez que para alguns doutrinadores o monopólio do setor deve ser...

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